segunda-feira, 13 de abril de 2009

FIB , "Qualquer semelhança com PROUT é mera coincidência"

AS NOVE DIMENSÕES DO FIB
Por:Marcos Arruda

“O índice FIB é uma abordagem holística às necessidades humanas, porque sem atender às necessidades tanto materiais como espirituais das pessoas e da sociedade, não é possível tornar realidade uma ‘sociedade boa e decente’.” (Thinley, 2007: xv)

“Desenvolvimento devia ser entendido como um processo que busca maximizar a Felicidade, em vez do crescimento econômico... reconhece que o indivíduo tem necessidades, materiais, espirituais e emocionais.” (Bhutan, 2020).

O índice do Butão leva em conta indicadores que cobrem nove campos da vida familiar e social da população. Cabe a nós, brasileiras e brasileiros, pesquisar a melhor maneira de definir Felicidade na nossa cultura, e desenhar os melhores indicadores para medi-la. O FIB é uma ferramenta de medida adequada para este objetivo: leva à redefinição do objetivo do desenvolvimento, à afirmação de um outro modo de planejar e organizar a economia, e à reorientação da economia e da tecnologia para que sirvam aos objetivos superiores do desenvolvimento social e humano.

1. Padrão de vida
Padrão de vida tem a ver com todas as necessidades materiais e a economia real. Padrão de vida digno é aquele que permite a todos e cada um ter suas necessidades básicas satisfeitas. O índice FIB identifica a proporção de padrão de vida digno que a sociedade logrou alcançar para toda a população, e as carências a preencher através de políticas públicas e de atividade produtiva e distributiva por parte da mesma sociedade. Concluido o índice FIB, abre-se outra etapa em que tais carências passam a fazer parte do plano de desenvolvimento socioeconômico.
Ficam evidentes, assim, duas coisas: uma, que o índice FIB é só um instrumento e um meio para o objetivo maior que é o desenvolvimento; a outra, que o desenvolvimento não pode ser só econômico, mas tem que ser, ao mesmo tempo, social e humano, e tem que ser realizado respeitando os limites da Natureza e da solidariedade entre as gerações. Por isso falamos em economia do suficiente, em relação à produção material, e economia da abundância em relação à partilha dos bens não materiais – conhecimento, sociabilidade, comunicação, arte como beleza, ética, afeto, amor.
As metas quantitativas que o índice FIB permite definir orientam efetivamente a economia para a satisfação dos direitos de todas e todos enquanto pessoas e cidadãs: direito à vida, ao trabalho, à alimentação saudável, à saúde, à educação, à habitação, a um ambiente limpo e são, à segurança... Todos estes direitos, quando satisfeitos, constituem diversas formas de riqueza, que evidentemente não são só materiais.
O mundo do capital é feito de divisões e separações: desigualdades entre classes sociais, ganância e voracidade pelo lucro e pelo dinheiro, trabalho explorado e alienado, falta de acesso da maioria aos bens e recursos produtivos, excesso de consumo e de lixo, envelhecimento planejado dos bens de consumo, e quantas outras enfermidades sociais. Em suma, no sistema comandado pelo capital e pela busca desenfreada de lucro, a maioria não tem um padrão de vida que satisfaça seus direitos e garanta uma existência digna para si e suas famílias. Isto ocorre porque o econômico está divorciado do social.
A proposta do FIB é reorientar a atividade econômica – economia entendida como gestão da casa (eco+nomia) – para a satisfação das necessidades de toda e cada comunidade e pessoa que compõe a sociedade. Para isso, é preciso mudar conceitos e leis, de modo a garantir um novo modo de relação social de produção, distribuição e consumo, a saber:
* substituir a forma excludente de propriedade dos bens produtivos por formas compartilhadas, fundadas no trabalho e no uso como valores primordiais;
* superar o sistema assalariado, que permite a apropriação do trabalho social por poucos donos do capital;
* criar formas eficazes de distribuição equitativas da riqueza social, seguindo o princípio da proporcionalidade (a cada um segundo suas necessidades, de cada um segundo suas capacidades);
* estabelecer que o trabalho, a terra e o dinheiro já não são mercadorias, mas serão empregados como fontes geradores de riqueza social e valorizados pelo seu valor de uso;
* criar formas inovadoras de remuneração cidadã, assim como os meios legais de garantir a distribuição equitativa dos ganhos da produtividade do trabalho, para que as pessoas liberem tempo para desenvolver as suas dimensões especificamente humanas, sociais, culturais e espirituais;
* enfim, introduzir a cooperação como modo principal de relação entre os atores econômicos, em vez da competição que lança todos contra todos e está entre os principais obstáculos para a paz.
O FIB dá os elementos para a definição de um plano de metas para as diversas atividades econômicas, orientando-as à realização do que são fatores socioecônomicos de um padrão de vida digno para toda a população, portanto, componentes de um índice de Felicidade sempre maior.

2. Boa governança
A boa governança se define pela sábia gestão do poder econômico e político de modo a garantir que a sociedade crie e preserve as condições materiais, sociais, culturais e ecológicas de viver em harmonia, alegria, paz e Felicidade.
Governança tem a ver com gestão de pessoas, de instituições, de territórios e de recursos. A boa governança se chama democracia, no sentido pleno da palavra: ela combina de forma harmônica e criativa o sistema representativo com o participativo, a autoridade dos governos com a autonomia e a autogestão da sociedade, a democracia representativa e a democracia direta. A autoridade e a liderança são essenciais, mas o modo de exercê-las é que determina se visam dominar ou libertar. Na perspectiva libertadora, toda autoridade e liderança busca promover e facilitar o empoderamento dos sujeitos sociais para que se tornem protagonistas do seu próprio desenvolvimento. A partilha do poder de decisões e de gestão da economia e do desenvolvimento é, pois, indispensável. Também o é a redefinição do papel do Estado e da relação Estado, economia social, e economia privada.
A governança do Estado nas repúblicas é partilhada por três poderes teoricamente autônomos, independentes e complementares: Executivo, Legislativo e Judiciário. Isto vale desde a comarca ou comuna, passando pelo município e o estado, até o país. No plano internacional, a necessidade de boa governança levou à criação da Liga das Nações, depois da ONU e das organizações financeiras multilaterais. Todas elas estão defasadas e os atores preponderantes da governança global são as grandes corporações transnacionais.
Um exemplo gritante de má governança é a maneira como é gerido o Orçamento Público da União no Brasil. Para 2009, R$ 233,2 bilhões serão gastos no pagamento da divida pública financeira. Somada a rolagem da divida (troca de títulos velhos por títulos novos), chega-se ao mon­tante de R$ 758,8 bilhões. Portanto, quase a metade do orçamento fiscal e da seguridade social de 2009 (48%) está comprometida com os credores financeiros do governo. Enquanto isso, os serviços públicos de base continuam deteriorados e ineficientes, em prejuízo da maioria empobrecida do País. O FIB investiga o papel do dinheiro na vida das pessoas, e como sua carência e o endividamento afetam o padrão e a qualidade de vida.
O desafio da boa governança atravessa as várias esferas da vida humana. Pela ótica democrática, está em questão a autogestão do desenvolvimento por cada pessoa, cada família e comunidade, ecossistema, bioma, município, estado, país e a própria gestão partilhada do Planeta.
Na perspectiva do FIB, indicadores para todos esses níveis de governança precisam ser definidos a fim de identificar o grau de Felicidade ou a carência dela relativos à eficiência e eficácia da governança, desde a esfera institucional e das políticas públicas em cada um dos níveis, até a esfera da vida familiar e pessoal.

3. Educação
A abrangência, a qualidade e o alcance da educação são elementos a pesquisar para estabelecer o FIB.
Uma educação abrangente é aquela que envolve a totalidade dos aspectos e dimensões da existência humana, individual e coletiva. Uma educação omnilateral abrange desde os aspectos relacionados à pessoa até os que a situam nos contextos sociais e históricos mais abrangentes; ou pelo menos todos os campos que lhe permitam o desenvolvimento mais completo possível das suas forças produtivas, criativas e comunicativas enquanto ser humano e trabalhador3, das suas necessidades e da capacidade de satisfazê-las; e omnidimensional, que abrange todos os modos e faculdades de conhecimento que o trabalhador possui, todas as dimensões e todos os potenciais do seu ser, desde o corpo e seus sentidos até a mente, a psique, o espírito com seus múltiplos atributos.
A qualidade implica que a educação, além de capacitar as e os educandos para o trabalho produtivo e criativo de bens e de saber, seja capaz de promover e apoiar o auto-empoderamento dos educandos para a autonomia, a cooperação e a solidariedade. Pois, lembrando Paulo Freire - ninguém educa ninguém, e ninguém se educa sozinho – acrescento que ninguém empodera e desenvolve ninguém, e ninguém se empodera e se desenvolve sozinho.
O alcance tem a ver com o envolvimento de toda a população - crianças, jovens, adultos e idosos - em processos educativos permanentes, que lhes permitam estar continuamente se empoderando para gerir com mais eficácia o seu próprio desenvolvimento, enquanto seres individuais, comunitários, sociais, planetários e cósmicos, consciências que herdaram a responsabilidade de gerir sua própria evolução e o desenvolvimento pleno dos seus potenciais. É difícil encontrar um país no mundo de hoje que tenha um sistema educativo tão integral, mas este é o objetivo implícito no FIB. E ele exige um corpo docente educado para a educação que liberta e não subordina; bem remunerado; disposto a reciclar seus conhecimentos continuamente através da pesquisa, do trabalho e do diálogo criativo para dentro e para fora da academia.
Outros aspectos a incluir neste campo incluem:
* a liberdade de escolha de campos de estudo e trabalho;
* o tempo disponível para a atividade educativa (estudo, pesquisa, leitura, diálogos e debates, sistematização da prática) na vida da pessoa, como docente e como discente;
* os campos que estão ausentes ou são insuficientemente contemplados, como as artes, a comunicação, o aprendizado da autogestão da própria saúde e alimentação, as condições para a Felicidade na relação afetiva e conjugal, as condições que propiciam ou bloqueiam o amor.

4. Saúde
Este é um campo de enorme importância para o FIB. Visto pela ótica do capital, ele saiu da esfera dos serviços públicos e foi privatizado e mercantilizado. E pelo pior viés: o que tem preço e é fonte de lucro privado não é a saúde, mas sim a doença, os tratamentos e os medicamentos! Os indicadores habituais são número de médicos e enfermeiros, número de atendimentos, consultas, exames, número de leitos de hospitais, quantidade de medicamentos vendidos, etc. De direito humano a ser contemplado pelo serviço público de saúde, o capitalismo neoliberal converteu a doença em mercado, e o direito à saúde em mercadoria que tem que ser comprada individualmente, através de planos de saúde privados, que só são acessíveis às classes mais abastadas.
Outra dimensão importante deste campo do FIB é a autogestão da saúde individual e comunitária. Tem a ver com o tema da governança, que tratamos acima. Quem deve ter poder sobre minha saúde física, vital, mental, espiritual? Eu próprio, e cada sujeito, da sua! Mas a cultura do capital nos afasta do poder de conhecermos e gerirmos nossa própria saúde, omitindo ou excluindo este campo do saber dos programas e currículos da educação formal. A cultura do capital tenta nos convencer de que saúde é responsabilidade de peritos e não de cada pessoa: divulga por todos os meios a cultura da dependência de especialistas, hospitais e empresas farmacêuticas. Por isso, praticamente não existe lugar para a medicina preventiva nem para as atividades produtivas da saúde, como a cultura de plantas medicinais, a preparação de medicamentos naturais, a aprendizagem da alimentação adequada, o equilíbrio entre exercícios físicos e atividades sedentárias, o uso de produtos da terra como plantas, frutas, verduras, de emprego doméstico, argila, metais como ouro, cobre, etc. para o tratamento e a cura de enfermidades comuns sem recorrer a médicos nem a remédios industriais.
O FIB permite identificar quais as carências das cidadãs/cidadãos em relação ao acesso aos serviços de saúde, à sua qualidade, ao seu caráter social ou privado, assim como ao conhecimento sobre como gerir e preservar a própria saúde, curar as doenças, equilibrar os fluxos energéticos dos nossos corpos. Usado para guiar o planejamento da política pública de saúde, o FIB permite orientar os investimentos para suprir as carências que impedem a saúde de ser fator de Felicidade para a cidadania.

5. Resiliência Ecológica
É a capacidade de um ecossistema de recuperar seu estado inicial depois que ações humanas o alteraram. Os elementos que formam os ecossistemas e os biomas que dão origem e sustentam a vida são a Terra, a Floresta, o Ar, a Água e a Biodiversidade.
O problema dos riscos de catástrofes ambientais de grande escala, e os processos destrutivos de ecossistemas e biomas que a humanidade vive hoje, estão estreitamente ligados à lógica do capital, que define desenvolvimento como crescimento econômico, ou obtenção e acumulação do máximo lucro guiando a pesquisa científica e o avanço tecnológico. Também tem a ver com a formação de preços tomando em conta apenas os custos financeiros – matéria-prima, insumos, energia, máquinas e equipamentos, força de trabalho, crédito – sem considerar os custos sociais e ambientais do investimento. Estes ficam descartados como “externalidades”, a serem bancadas pela população, pelos consumidores ou pelo Estado. Entre eles está a destruição de mananciais de água doce, o desmatamento, a erosão e poluição dos solos, das águas e do ar, as emissões de gases de efeito-estufa e o aquecimento global, a produção desenfreada de lixos tóxicos e sua exportação para países e comunidades mais débeis e vulneráveis.
O FIB propõe uma abordagem diferente, baseada na noção de que o que fazemos contra a Natureza, fazemos contra nós mesmos. O Butão já tomou medidas estruturais para defender a capacidade de resiliência ecológica dos seus ecossistemas: dados publicados em 2007 informam que 26% do país são áreas protegidas e as florestas ocupam 72% do território. É preciso, porém, que se encontre o justo equilíbrio entre este campo de indicadores e o do padrão de vida, sobretudo no aspecto da soberania e segurança alimentar. Isto mostra que a abordagem do FIB não pode levar-nos a olhar os campos isoladamente, mas também a interação entre eles, sempre na perspectiva da criação das condições mais propícias para a realização da Felicidade individual e coletiva.


6. Diversidade Cultural
A maioria dos países do mundo contemporâneo possuem grande ou imensa diversidade cultural. O Brasil é um caso entre outros. Aqui a diversidade cultural existe em cima de uma dolorosa construção histórica colonial – conquista, genocídio, escravismo, barbárie de todo tipo contra as populações autóctones, imigrantes de diversos países, e a raça negra trazida da África para servir aos fins econômicos e comerciais dos europeus e das elites abastadas que o capitalismo mercantil e industrial constituiram.
A cultura do capital, motivada pela busca incessante do máximo lucro por qualquer meio, busca sempre maiores ganhos através de economias de escala. E estas conduzem à homogeinização dos produtos, dos gostos, das mentalidades e das aspirações humanas. No espaço dos negócios, essa cultura promove uma incessante competição entre os atores econômicos em busca do controle monopólico dos seus respectivos mercados e da mente dos consumidores. Resulta daí uma economia e uma sociedade voltadas para a confrontação, a guerra, a subordinação ou a eliminação do Outro, do diferente.
A Socioeconomia Solidária toma como fundamento filosófico o conceito do Ser Humano como indivíduo social, cordialis, amans em vez de oeconomicus, aggressans, e portanto, como uma espécie diversa de outras no contexto do reino animal, e composta por uma diversidade de raças, etnias, culturas, tradições. Daí seu apreço pelo princípio-guia da vida coletiva: o princípio da complementaridade do diverso. A diversidade cultural, vivida na perspectiva da cooperação e da solidariedade, é fonte de riquezas materiais e de maiores saberes e afetos do que cada cultura isolada. Isto exige a interiorização do fato de que somos solidamente interconectados, pelo fato de sermos irmãos e irmãs do gênero humano, de termos origens comuns e destinos cada vez mais convergentes. Com a globalização, fica mais verdadeiro do que nunca a consigna: o que fazemos aos outros e à Mãe Natureza, fazemos a nós mesmos.

7. Vitalidade Comunitária
Tendo em vista que o Ser Humano é um ser social, relacional, que existe, se identifica e se realiza na comunicação, seja interpessoal, seja com coletivos humanos, a vitalidade comunitária é uma dimensão indispensável da busca de Felicidade. Mas também no plano da atividade econômica, a nossa dimensão social é importante: somos seres interdependentes para sobreviver fisicamente e para obter a máxima qualidade de bem-viver.
A vida social e comunitária – trabalho, convivência, sociabilidade, intercâmbio de saberes, diversão, desenvolvimento mental, psíquico e espiritual - exige condições que transcendem a existência meramente física da pessoa. No entanto, a condição de pobreza e exclusão social de grande parte da população do Brasil e do mundo impedem uma vida comunitária saudável. A incidência da pobreza, da marginalidade, da falta de acesso à educação, à saúde, aos recursos básicos para a sobrevivência física se traduzem em violência. E em escala crescente, dado que a violência é uma expressão eloquente da carência de vitalidade comunitária, e do carinho, afeto e amor sem os quais o Ser Humano se desfigura, adoece, morre... ou passa a matar.
Só uma economia fundada nas instâncias da família e da comunidade, e informada pelos valores da cooperação, do altruísmo recíproco, da solidariedade consciente e do amor é que dará fundamento a famílias e comunidades equilibradas e felizes. O FIB, ao investigar os diversos aspectos da vida familiar e comunitária das pessoas, inclusive idosos e crianças, facilita a formulação de políticas que ajudem a criar ambientes propícios para a vitalidade comunitária, e ofereçam as condições materiais e sociais para a convivialidade.

8. Uso equilibrado do tempo
Este é um dos fatores mais importantes da Felicidade, embora mal suspeitemos disso. Para a cultura do capital, tempo é dinheiro... Para nós, é trabalho, saber, criatividade, se soubermos bem usá-lo. Tempo é também, e principalmente, desenvolvimento, no seu sentido mais profundo de desenvolvimento mental, psíquico, espiritual! Não é por acaso que o humanista Karl Marx diz: “uma nação é verdadeiramente rica quando o dia de trabalho é de seis em vez de 12 horas. A riqueza não é o domínio sobre o tempo de trabalho excedente, mas im o tempo disponível fora do que é necessário na produção direta, para cada indíviduo e para toda a sociedade” (Marx, 1857-58: 706 – grifos meus). Nesta ótica, tempo é riqueza! Tempo liberado das tarefas ligadas à produção direta e à sobrevivência física é tempo disponível para o trabalho sutil de desenvolvermos nossas dimensões especificamente humanas, não somente animais! Lembremos que fazemos parte do reino da Noosfera, que já transcendeu a Biosfera, embora proceda dela e se apoie nela para subsistir em todos os planos.
O FIB busca identificar se estamos usando nosso tempo de modo equilibrado. Aqui, há que reconhecer que o tempo disponível, como toda outra riqueza, é função do modo de distribuição de todas as riquezas de uma sociedade. Quando estas são concentradas em classes abastadas, privilegiadas, o tempo disponível também está concentrado nelas. É o caso do Brasil. Para democratizar o tempo disponível, precisamos reestruturar a economia, criando mecanismos de democratização da renda, dos bens e recursos produtivos, do dinheiro como poder de compra, e dos ganhos gerados pelo aumento da produtividade. Tudo isso pode ser medido com indicadores.
É importante termos consciência de que a pergunta “como estou usando meu tempo?” é cabível tanto para as pessoas, como para seus ambientes de vida e trabalho – família, empresa, consultório, associação, entidade, repartição de governo. Ela é precedida por outra pergunta: “que atividades e ocupações me fazem feliz?”
É útil nos colocarmos essas duas questões para o nosso cotidiano, mas também para outras escalas de tempo – a semana, o mês, o ano... As perguntas incluídas no questionário canadense me parecem insuficientes, pois deixam de fora alguns temas importantes para países como o Brasil e megacidades como as que temos aqui: tempo gasto no transporte, uso deste tempo, tempo dedicado às artes, tempo dedicado à comunicação presencial, tempo dedicado à cooperação, tempo dedicado ao estudo e à educação permanente...

9. Bem estar psicológico e espiritual.
A educação para o desenvolvimento integral do Ser Humano deve ser omnilateral e omnidimensional justamente porque o seu objetivo maior é o bem viver psíquico e espiritual omnilateral e omnidimensional.
O bem estar psíquico e espiritual consiste em vivenciar encontros reciprocamente gratificantes entre pessoas, ter o sentido de comunhão com os outros e com o meio natural, o sentido de pertencimento, o acesso à tradição e à integridade cultural.
Alguns indicadores que favorecem a medida do bem estar incluem Felicidade/infelicidade subjetiva, satisfação/insatisfação com a vida, alegria de viver, liberdade/coerção, equidade/desigualdade, irmandade/separatividade, cooperação/competição, reciprocidade/unilateralidade, satisfação/insatisfação com dimensões como saúde, finanças, ocupações cotidianas, relações com familiares e amigos, espiritualidade (relação pessoal com o Divino), vida social e vida religiosa, frequência de sentimentos como empatia, alegria, bondade, perdão, raiva, inveja, culpa, medo, ressentimento, egoismo, orgulho, dor, frustração, problemas físicos ou mentais, e outros.
Esta diversidade de fatores do bem estar incluem também o transporte. Catherine O’Brien (2007:97) observa que o sistema de transporte “diz respeito não apenas a ‘mover pessoas e bens’, mas também gerar encantamento, descoberta, alegria e felicidade. Ela mostra como o modo, as distâncias e o efeito do transporte do diário para o trabalho por longas distâncias afetam o tempo disponível, o grau de bem viver e felicidade.
O ambiente e as condições propícias para o bem estar psíquico e espiritual inclui a satisfação das necessidades básicas (padrão de vida digno) e um meio natural e social saudáveis, cooperativos e não tóxicos, agressivos ou violentos.
Observemos enfim que, em última instância, todos os campos anteriores condicionam a realização da Felicidade neste campo.
BIBLIOGRAFIA

Arruda, Marcos, 2006, “Humanizar o Infra-Humano:

Arruda, Marcos, 2007, “Tornar Real o Possível:

Arruda, Marcos (org.), 2009, “Intercambiando Visiones de una Economía Responsable, Plural y Solidaria”, ALOE/PACS, Rio de Janeiro.

Bhutan 2020, « A Vision for Peace, Prosperity and Happiness”, Planning Commission, Royal Government of Bhutan.
http://unpan1.un.org/intradoc/groups/public/documents/APCITY/UNPAN005249.pdf

Marx, Karl, 1857-58, “Grundrisse: Introduction to the Critique of Political Economy”. New York: Vintage Books [1973 – traduzido por Martin Nicolaus].

O’Brien, Catherine, 2007, “Planning for Sustainable Happines: Harmonizing our internal and external landscapes”, in “Rethinking Development…”, p. 97ss.

The Centre for Bhutan Studies, 2007, “Rethinking Development: Proceedings of Second International Conference on Gross National Happiness”, Phama Printing & Publishers, Thimphu, Bhutan.

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