sábado, 28 de fevereiro de 2009

A crise do capitalismo e a sua superação

Qual é a natureza da atual crise do capitalismo? "O capitalismo sobreviverá ao século XXI?", pergunta Pedro A. Ribeiro de Oliveira, professor da PUC-Minas e membro de ISER-Assessoria, em artigo que recebemos e publicamos na íntegra. Ele busca responder as perguntas a partir da sua participação do Fórum Social Mundial 2009. Segundo ele, o "FSM é talvez o principal espaço mundial de articulação desse sujeito histórico coletivo, mas não é o único. É um estimulante espaço de diálogo e participação democrática, merecendo por isso todo respeito, mas é evidente que o processo histórico de superação do sistema capitalista requer muitas outras contribuições e provavelmente ainda ocupará uma boa parte do século XXI".
Eis o artigo.

O triunfo do capitalismo na guerra fria fez mais do que destruir o socialismo soviético: desde 1990 o ideário neoliberal tornou-se a referência obrigatória para a Economia Política. Quem não se alinhasse àquele pensamento passava por “atrasado”, incapaz de acompanhar o êxito do primeiro mundo cuja tecnologia de ponta seduz os povos. Naquele contexto, a realização do I Fórum Social Mundial, em 2001, parecia não ser mais do que um contraponto de menor importância ao Fórum Econômico que reunia nos Alpes suíços os responsáveis pelo mundo dos negócios em escala global. Estes, sim, davam a impressão de poderem decidir os rumos da Humanidade. Passados apenas oito anos, porém, a realidade é bem outra: enquanto em Belém do Pará membros dos diversos Movimentos Sociais reafirmam que “um outro mundo é possível” e falam dos avanços nessa direção, os global players do capitalismo reunidos em Davos pedem socorro ao Estado para evitar a falência do sistema financeiro mundial.

A instabilidade criada pela irresponsabilidade do sistema financeiro dos EUA se alastrou pelo mundo e já afeta toda a economia mundial. Durante um ano ela foi subestimada, como se não passasse de um desequilíbrio restrito a um setor, mas hoje ninguém duvida da sua gravidade. O foco do debate está na sua natureza e nos desdobramentos que ela poderá tomar. Este artigo tem por finalidade alimentar esse debate com a apresentação de algumas idéias levantadas no Fórum Social Mundial. Fique claro que se trata de uma síntese pessoal, desenvolvida a partir do que li e ouvi nas palestras das quais participei.

O foco do debate: a natureza da crise atual
A teoria econômica clássica encara as crises como ocorrências cíclicas e portanto normais no sistema capitalista, cujo crescimento sempre alterna tempos de expansão e de contração da economia. Em favor deste argumento pesa o fato de já se registrarem 46 crises no sistema de mercado desde 1790. Segundo essa teoria, as crises são o principal fator de aperfeiçoamento do mercado, posto que o obrigam a corrigir seus erros e exageros. Para essa corrente de pensamento, que domina o Fórum Econômico de Davos, o mais importante hoje é evitar todo “alarmismo” e recuperar a confiança no setor financeiro. Em termos práticos, isso significa injetar uma enorme quantidade de fundos públicos em socorro de instituições financeiras e empresas (no início de fevereiro essa injeção já alcançou o equivalente a quase dois trilhões de dólares) para tranquilizar o mercado e assim reativar a economia. Seguindo essa receita, em breve passará a turbulência e o capitalismo seguirá sua trajetória triunfal, ainda que ao preço de maior controle externo sobre as empresas financeiras.

Não é assim, contudo, que os intelectuais e representantes de Movimentos Sociais participantes do FSM encaram a crise atual. Todos sabemos que as crises no capitalismo são cíclicas e contribuem para depurá-lo de seus erros, mas isso não significa que esse sistema tenha a garantia da perenidade. Esboçado nas cidades do norte da Itália desde o século 13, estruturou-se no século 16, provocou a revolução industrial no século 18 e consolidou-se por meio das revoluções política e cultural do século 19. No século 20 atingiu a maturidade, ao mundializar- se pelo processo de globalização. Ao longo do tempo, não só assumiu diferentes formas – mercantilista, liberal, imperialista- colonial, de bem-estar social e neoliberal – como transferiu seus pólos (das cidades italianas para Amsterdã, dali para Londres e depois Nova York, de onde pode vir a transferir-se para Pequim). Todas essas mudanças foram acompanhadas de graves crises, em geral resolvidas por meio de guerras. O que se pergunta agora é se ele sobreviverá ao século 21.

Evidentemente, essa pergunta não entra na pauta do pensamento econômico neoliberal, que descarta a priori a possibilidade de o sistema capitalista vir a desaparecer – exceto na ocorrência de uma verdadeira catástrofe humana e natural – mas está cada vez mais presente na agenda intelectual de quem crê num “outro mundo possível”. Apresento aqui, em poucos parágrafos, os argumentos levantados em favor da hipótese de ser esta uma crise sistêmica que, por ser muito mais do que uma crise econômico-financeira , só poderá ser superada por meio de outro modo de produção e de consumo. Concluo o artigo analisando uma das experiências que apontam para a viabilidade histórica dessa superação do sistema capitalista de mercado.

Crise do sistema produtivista / consumista de mercado
Estamos, sem dúvida, imersos numa grave crise financeira. Basta ter presente que enquanto o PIB mundial alcançou quase US$ 55 trilhões, em 2007, o volume dos direitos negociados no sistema financeiro mundial chegou a quase US$ 600 trilhões. O mesmo indicador do valor (a moeda expressa em US$) aplica-se a duas realidades muito diferentes: o volume de bens e serviços efetivamente produzidos, e a compra e venda de direitos que são repassados sem que nenhum novo bem tenha sido produzido (por isso, chamados de derivativos) . Esses dados referentes à forma mais avançada do capitalismo podem ser resumidos no mote “lucrar sem produzir”.

Ainda que esse lucro puramente especulativo viesse a ser coibido, o sistema capitalista continuaria sob ameaça de colapso devido aos efeitos não-econômicos dos processos econômicos regidos pela lógica do lucro capitalista. Efeitos como a produção de lixo, o desperdício de matérias-primas e energia, a destruição da biodiversidade, a degradação dos solos e das águas, doenças (p.ex. o teor de enxofre no diesel da Petrobrás, os transgênicos da Monsanto), a exclusão social e a revolta dos oprimidos, são chamados de externalidades pela teoria econômica liberal. Por não contabilizá-los, o capitalismo consegue produzir enorme quantidade de riqueza e muitos lucros. O problema, agora, é que, a se manter a mesma lógica econômica, as externalidades se voltarão contra o sistema e o travarão. O déficit energético, o aquecimento global e a desumanização das relações sociais estão hoje a apontar que o sistema capitalista de mercado está prestes a esgotar sua capacidade de produzir riqueza.

Vejamos, em poucas linhas, como se apresenta hoje esse quadro de externalidades que ameaçam travar o funcionamento do sistema de mercado.

O produtivismo consumista do capitalismo tem fome de energia. O carvão para a “revolução industrial”, e mais tarde, a hidroeletricidade e o petróleo em abundância, permitiram a farra consumista do século 20. É verdade que essa farra só é real para cerca de um bilhão de pessoas (que consomem 80% das riquezas do mundo), pois outro tanto passa fome e a grande maioria da população da Terra consome apenas o suficiente.

Acontece que essas fontes de energia ou não são renováveis (carvão, petróleo, gás) ou são fisicamente limitadas (hidroeletricidade) . O mundo está num impasse: ou desenvolve novas fontes de energia, ou renuncia ao produtivismo consumista. O bilhão de pessoas que forma a “burguesia mundial” coloca suas esperanças nas novas fontes de energia que sejam renováveis (como a agroenergia) e, o quanto possível, “limpas”. A técnica representa para essa classe a grande esperança: ela acredita que um dia cientistas e pesquisadores descobrirão fontes de energia que lhe permita manter o atual padrão de consumo sem risco de esgotamento. Como esse dia ainda não chegou, os ricos continuam consumindo vorazmente os recursos da Terra, enquanto os pobres sonham poder consumir igual...

Enquanto isso, a Terra vê aproximar-se uma nova era geológica marcada pelo aquecimento global. Embora esse processo provavelmente se deva também a vários outros fatores, é certo que o produtivismo consumista é responsável por sua aceleração. As estimativas são incertas, porque o tempo da Terra é muito mais longo do que a biografia dos humanos, mas não resta dúvida que os regimes climáticos atuais sofrerão grandes mudanças. O degelo da calota polar, o alagamento das zonas litorâneas, a expansão dos desertos (o “rio aéreo” da floresta amazônica pode secar) e a desertificação dos mares são previsíveis: só falta acertar o ano...

Neste momento de crise global, o mundo se desumaniza na medida em que impera a “lei” do mais forte. O massacre do povo palestino na Faixa de Gaza, pelo terrorismo de Estado de Israel, não sofreu real oposição dos governos das grandes potências mundiais, que se limitaram a criticar a desproporção da retaliação israelense contra o Hamas. Outros conflitos desumanos e sangrentos ocorrem na África, onde milícias tribais e exércitos (em grande parte formados por meninos, pois a tecnologia atual não requer força física para empunhar uma arma!) ceifam milhares de vidas, enquanto mulheres são violentadas e a ajuda em alimentos é saqueada. Muitas dessas guerras são incentivadas por interesses externos, ligados à mineração – além das antigas empresas européias e estadunidenses, é importante a presença de capitais chineses, principalmente nas obras de infraestrutura para exportação.

Nesse contexto de desumanização, esgarçam-se os laços de solidariedade e difunde-se uma atitude cínica, que transforma todas as desgraças em espetáculo televisivo. Aliás, este é um tema recorrente no cinema, desde o sucesso do Titanic: espetacularizar o afundamento da civilização ocidental.

Para superar a crise: a parte da teoria
Fomos acostumados a ver a economia como uma área de conhecimento especializado, sobre a qual só gente com muito estudo (de preferência, numa universidade dos EUA) pode se pronunciar. Esquecemos que a teoria econômica nasceu como Economia Política, ao desligar-se da Ética que até o século 18 regulava o mercado. Só recentemente o pensamento neoliberal separou a Economia como ciência do funcionamento do mercado, e a Política como ciência que estuda o funcionamento do Estado. (Por isso o Presidente Lula confiou o Banco Central a Henrique Meirelles, como se as decisões macroeconômicas não fossem eminentemente políticas). A eclosão da crise implode essa compartimentaçã o de saberes e obriga a alargar o conceito de Economia, para que as relações sociais de produção e distribuição das riquezas sejam inseridas no âmbito das relações dos humanos com a Terra, relações estas que não podem perder seu caráter ético.

Essa mudança na teoria econômica permite-nos descortinar um cenário inteiramente diferente daquele que nos é traçado pelos economistas do sistema. Ao privilegiar a lógica do valor de uso sobre a lógica do valor de troca, o mercado se tornará simples regulador entre a oferta e a procura, perdendo o poder de gerar lucro para quem transforma dinheiro em capital. Essa teoria de um modo de produção e consumo vem sendo chamada de “ecossocialismo” , “socioeconomia solidária”, e outros nomes. Não vou me estender sobre o tema; basta esclarecer que institutos sociais como a economia solidária, a cooperativa e o planejamento estatal podem com vantagem substituir o mercado na regulação da produção, desde que seja respeitado o princípio da subsidiariedade: não assuma a instância maior o que a instância menor é capaz de fazer.

Talvez o pensamento e o exemplo de Ghandi – que faz a ponte entre a racionalidade ocidental e a sabedoria indiana – venha a servir como inspiração para um modo de produção voltado não para o crescimento econômico, mas para o bem-estar de todo ser vivo. Seu ideal humanista de simplicidade de vida, de não-violência (inclusive contra os animais, daí sua prática vegetariana) de autonomia local e regional, pode ser a base de uma nova economia: uma economia que abdica da utopia produtivista do progresso sem fim, para alcançar a utopia da harmonia universal com toda a comunidade de vida – a bela e provocante expressão usada na Carta da Terra para designar o conjunto dos seres viventes, superando o especismo humano.

Será mesmo ingenuidade propor um modo de produção e consumo calcado na simplicidade de Ghandi? Haveria perda substancial para um bilhão de pessoas acostumadas ao automóvel, a viagens aéreas, ao ar condicionado e a outros hábitos que a maioria da humanidade desconhece – embora sonhe um dia também usufruir. Mas outros 5,5 bilhões de pessoas teriam muito a ganhar se a renda mundial per capita estimada em US$8.200 fosse equitativamete distribuída: cada uma receberia o equivalente a R$1.500 mensais. Mesmo descontados os impostos, essa renda é mais que suficiente para viver, se a família contar com serviços públicos eficientes na área da seguridade social, educação e transporte. Com isso quero dizer que não se supera a crise pelo aumento da produção de bens e serviços, mas sim pelo crescimento zero acompanhado da partilha equitativa dos bens já disponíveis. Para sair da crise, há que pensar unidades de produção locais, articuladas em rede, com baixo consumo de energia (em relação aos parâmetros atuais nos países e setores ricos) e submissão aos imperativos éticos, pois não cabe economizar no custo monetário quando isso implica custo ecológico ou humano.

Será isso uma utopia? Sim, com certeza, mas é uma utopia que merece maior credibilidade do que as utopias da tecnologia onipotente, do progresso sem fim e da satisfação dos desejos por meio do consumo de mercadorias.

Para superar a crise: a parte da prática
Para concluir, apresento em poucas linhas algumas lições advindas do Fórum Social Mundial realizado em Belém. Elas mostram que muitos elementos desse novo modo de produção e consumo já são realidade.
Estima-se que existem no mínimo 22 mil empreendimentos de economia solidária no Brasil, onde trabalham cerca de 2 milhões de pessoas. São, em sua grande maioria, pequenas unidades de produção e/ou consumo. A variedade é grande: empresas falidas ocupadas pelos empregados, assentamentos rurais, cooperativas de produção artesanal, grupos de coletadores de material reciclável, cooperativas de serviços, bancos com moeda local e muitos empreendimentos de geração de renda.

Não é preciso dizer que esses empreendimentos enfrentam inúmeras dificuldades para sobreviverem no mercado regido pela lógica concorrencial dos interesses privados. Às dificuldades de ordem jurídica, porque é complicado obter o estatuto legal requerido pela economia formal (v.g. emitir nota fiscal, participar de licitações), acrescentam- se as dificuldades de formação: além do aprendizado necessário ao gerenciamento de qualquer empresa, é preciso ter em conta a especificidade da lógica que rege a economia solidária, pois só consegue êxito num empreendimento desse tipo quem rompe com a lógica concorrencial vigente no mercado. Essa formação para um outro paradigma econômico é inteiramente nova, e não se aprende na escola mas no árduo trabalho de aprender com os erros e acertos, comparando experiências próprias e alheias.

Muitos passos, porém, já foram dados e hoje a economia solidária avança a olhos vistos, nas diferentes partes do nosso Planeta. É importante perceber que ela não quer ser uma forma de política social – focada no atendimento às necessidades de pessoas excluídas do mercado – mas política econômica – um novo modo de produzir, distribuir e consumir bens e serviços. Isso implica duas grandes dificuldades a serem vencidas..

A primeira é o salto do micro ao macro: uma coisa são os empreendimentos locais, que agrupam no máximo algumas centenas de pessoas trabalhando; outra coisa é sua capacidade de um dia vir a atender as necessidades de quase 7 bilhões de pessoas, muitas delas querendo satisfazer os desejos atiçados pela propaganda veiculada pelo sistema capitalista. Esse salto não poderá seguir o modelo capitalista – que gerou a empresas gigantescas, transnacionais, com poder maior do que muitos Estados nacionais – mas deverá espelhar-se na moderna organização em rede: inúmeras pequenas unidades autônomas quanto à sua gestão mas articuladas entre si na consecução de projetos comuns. “Pensar globalmente e agir localmente” significa, hoje mais do que antes, ter um pé firme na base local, o outro caminhando para uma articulação regional, e os olhos na articulação nacional, continental e planetária. A gestão dessa rede só será efetiva se basear-se numa verdadeira democracia na qual o poder econômico não tenha peso algum e as minorias sejam respeitadas dentro dos rumos traçados pela maioria.

A segunda dificuldade a ser vencida reside no campo dos valores que regem o comportamento humano. Desde o Renascimento europeu, a concepção da pessoa humana como indivíduo livre tornou-se a base dos valores e direitos que regulam as nossas relações com outras pessoas e com a natureza. Essa concepção, porém, veio de par com a economia capitalista de mercado, que a levou ao extremo do egocentrismo, como se fosse cada pessoa o eixo em torno do qual o mundo gira. Assim como o egocentrismo deu a forma moral ao modo de produção capitalista, um novo paradigma de valores deve acompanhar o modo de produção e consumo ecológico e solidário. Há quem fale de uma consciência planetária para designar esse novo paradigma onde o ser humano se vê como parte da grande comunidade de vida – parte importante, sem dúvida, mas sem arrogar-se o poder de dominar as outras espécies vivas. Essa nova forma de consciência precisa apoiar-se numa ética universalista (que inclua os direitos animais e os direitos da Terra) e só terá a ganhar se gerar uma espiritualidade que a anime desde seu interior.

Enfim, resta perguntar em que medida esse agente coletivo que se organiza para superar o sistema capitalista pode ser identificado com o FSM. É certo que muitas das pessoas reunidas em Belém do Pará representam movimentos sociais nascidos das bases mas que não se limitam a lutar por seus interesses específicos, porque os incluem no grande bojo das lutas pela vida do Planeta. Mas é certo, também, que muitos outros grupos e movimentos não estiveram no FSM, pelos mais diversos motivos. O FSM é talvez o principal espaço mundial de articulação desse sujeito histórico coletivo, mas não é o único.. É um estimulante espaço de diálogo e participação democrática, merecendo por isso todo respeito, mas é evidente que o processo histórico de superação do sistema capitalista requer muitas outras contribuições e provavelmente ainda ocupará uma boa parte do século 21.

http://congressoverde200 9.ning.com

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

TECNOLOGIA : Uma questão de liberdade

Sobre o software livre

Numa era cada vez mais digital, os softwares suportam nosso modo de vida. Eles
influenciam na forma de como nos relacionamos com o mundo, realizamos nossos trabalhos e fazemos circular a informação. Eles estão presentes em praticamente tudo que possui um dispositivo eletrônico, e estão diretamente ligados às nossas liberdades básicas, como a liberdade de pensamento, a liberdade de escolha e a liberdade de expressão.

A definição de Software Livre, segundo a Free Software Fundation, nos mostra claramente o que é verdadeiro à respeito disso. Quando falamos de software livre falamos de liberdade, não de preço. Software livre se refere à liberdade dos usuários executarem determinados programas, para qualquer que seja a finalidade (liberdade nº 0); a liberdade de estudar como eles funcionam e adaptá-los às suas necessidades (liberdade nº 1); a liberdade de copiar e redistribuir cópias (liberdade nº 2); e por fim, a liberdade de modificar e aperfeiçoar o programa, e liberar os seus aperfeiçoamentos de modo que toda a comunidade possa se beneficiar (liberdade nº 3). O acesso ao código fonte é um fator indispensável para que essas liberdades se dêem de forma plena.

O que queremos dizer com liberdade do software? A liberdade pode ser mantida por sistemas transparentes que são baseados em padrões abertos, seguros, incluindo formatos de dados e protocolos de comunicação. A liberdade do software significa um futuro para a tecnologia no qual podemos confiar, um futuro sustentável que não cause impactos negativos sobre as liberdades básicas. Formatos de dados proprietários podem significar um bloqueio ao acesso à informação. Códigos fonte fechados, representam uma limitação ao conhecimento. Softwares proprietários custam milhões à governos, empresas e universidades, dinheiro este que pode ser investido em educação, infra-estrutura e treinamento. Por isso que, em todo o mundo, existe hoje um grande movimento migratório para sistemas livres, pois é uma questão estratégica garantir a não dependência tecnológica. O Governo brasileiro e de diversos estados da federação, inclusive o governo do Paraná, já há tempos vem utilizando softwares livres na administração e empresas públicas, pois além de mais inteligentes e seguros, economizam milhões em licenças.

Softwares livres, são muito mais eficientes, estáveis e seguros (por exemplo: não pegam vírus). Possuem uma infinidade de aplicativos que realizam as mais variadas funções, sendo a maioria deles gratuitos que podem ser livremente baixados e utilizados. Também contam com suporte técnico de uma gigantesca comunidade de desenvolvedores, colaboradores e grupos de usuários, que disponibilizam todo tipo de tutoriais e alimentam centenas de fóruns de suporte que esclarecem qualquer dúvida de usabilidade. A compatibilidade com documentos de outros sistemas é total. Já foi o tempo em que, utilizar Linux, era algo restrito para poucos nerds (usuários mais avançados). Hoje em dia, o sistema está muito evoluído e muito fácil de usar.

A internet e a WEB 2.0

A internet ampliou de forma inédita a comunicação humana, permitindo um avanço planetário na maneira de produzir, distribuir e consumir conhecimento, seja ele escrito, imagético ou sonoro. Construída colaborativamente, a rede é uma das maiores expressões da diversidade cultural e da criatividade social da nossa época. Descentralizada, a Internet baseia-se na interatividade e na possibilidade de todos tornarem-se produtores e não apenas consumidores de informação, como impera ainda na era das mídias de massa. Na Internet, a liberdade de criação de conteúdos alimenta, e é alimentada pela liberdade de criação, de novos formatos midiáticos, programas, tecnologias e redes sociais. A liberdade é a base da criação do conhecimento.
A Internet requalificou as práticas colaborativas, reunificou as artes e as ciências, superando uma divisão erguida no mundo mecânico da era industrial. Ela é o palco de uma nova cultura humanista que coloca, pela primeira vez, a humanidade perante ela mesma ao oferecer oportunidades reais de comunicação entre os povos. E não falamos do futuro. Estamos falando do presente. Uma realidade com desigualdades regionais, mas planetária em seu crescimento.

O termo WEB 2.0 é uma metáfora que nos diz exatamente isso, nos fala de uma internet onde todos são criadores e produtores de conhecimento, atores de um mundo em transformação. Os websites de hoje em dia possuem ferramentas que permitem todo tipo de interatividade. O proprietário de uma página na web hoje não depende mais de um especialista para atualizar o conteúdo de seu próprio site. Um exemplo disto são os sites produzidos pela Ybytu-catu, que utiliza softwares livres, permitindo aplicar preços menores e oferecer aos seus clientes ferramentas com tecnologia de ponta, funcionabilidade e segurança.

Fonte: http://ybytucatu.com.br/

Links interessantes:
Ubuntu Linux: www.ubuntu.com
Kurumin Linux: www.kurumin-ng.com.br
Free Software Fundation: www.fsf.org
Creative Commons: www.creativecommons.org.br
Open Office (ferramentas de escritório): www.broffice.org
Gimp (editor de imagens)) www.gimp.org
Inkscape (gráficos e vetores): http://wiki.softwarelivre.org/bin/view/InkscapeBrasil
Fundação Mozilla (navegador e email): http://www.mozilla.org

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Pro-Colabore

O crescimento da rede é rizomático, distribuído e veloz. Não é organizado. Mas quem disse que seria organizado? O conhecimento é recombinante. Um dispositivo que se dá no remix. Tudo se transforma, nada se cria. A recombinação se dá na colaboração.

O que é colaboração? Essa é uma pergunta que fica sem resposta. Vou tentar discorrer sobre sem tocar na definição. Falar do que nos move. Não daquilo que é. Da relação entre as pessoas e não da coisa em si. Participamos da vida social. A colaboração como princípio de sobrevivência, como essência inerente do próprio ser humano. Um ser gregário, social, incapaz de viver sozinho. Daí a impossibilidade de se dissociar colaboração e interação das pessoas, de grupos, em torno de algo comum.

Colaboração não tem um significado estanque, pois acontece na ação. Pressupõe generosidade, que é limitada, parcial. Inconstante que é, supera diversidades, une e aproxima os diferentes. É fraterna, levando as ações a acontecerem não obrigatoriamente quando há necessidade. É uma lógica que não se mantém no cotidiano. Apresenta uma dinâmica caótica da relação do ser em comunidade.

Do ponto de vista de uma sociedade em rede, a produção cultural está sendo catalisada pela colaboração. Pessoas têm muito mais possibilidades de experimentação e realização de projetos. O próprio conceito do software livre corrobora com a idéia da colaboração. Foi no início dos anos 90, que Linus Torvalds, influenciado pelas idéias de Stallman, disponibilizou os códigos na rede. Essa história tornou-se conhecida. O Linux explodiu na rede da moçada e extrapolou limites geográficos. Milhares de programadores colaboram frequentemente com o software. Outros muitos milhares cooperam com outras comunidades.

Colaboração aponta para uma teoria social que contenha o princípio da continuidade

Da mesma forma que buscamos um modelo de desenvolvimento de software, alavancamos os aspectos de colaboração, de liberdade, de apropriação e replicação para a área do conhecimento. Surge, assim, uma comunidade de pessoas em rede que comungam por uma ética e uma cultura próprias, baseadas no compartilhamento do conhecimento e na ausência de hierarquias - verticalização dos processos. Essa comunidade clama por liberdade, por meio das iniciativas de produção de conhecimento em rede. Aliás, a sacada do Linus foi usar a internet para compartilhar o desenvolvimento de uma idéia. Não é à toa que o Linux aconteceu na mesma época da Internet. Emerge um modelo de produção colaborativa em rede.

A rede é catalisada pela internet. É assíncrona; o tempo não pára. O tempo flui numa complexidade caótica. O caos assusta também. Porque nos faz pensar, deixando-nos fragilizados frente à falta de controle que temos ou não das 'coisas'. Esse tempo assíncrono é uma ruptura. Assim como o ser que se redescobre esquizofrênico; assim como o espaço informacional que desconhece barreiras de ir e vir; assim como o conhecimento que se dobra, e liberta-se. O crescimento dessa rede é rizomático, distribuído e veloz. Não é organizado. Mas quem disse que seria organizado? O conhecimento é recombinante. Um dispositivo que se dá no remix. Tudo se transforma, nada se cria. A recombinação se dá na colaboração. Isso é a cultura hacker, né? Como usar o dispositivo para outras áreas do conhecimento?

Um dispositivo que dá visibilidade da articulação em rede para a transformação social. De certa forma, com a cultura hacker a produção tende ao infinitesimal (in)finito. O inteiro que contempla toda a multiplicidade. Colaboração aponta para uma teoria social que contenha o princípio da continuidade. A continuidade da ação comum. Um processo recursivo onde duas ou mais pessoas ou organização trabalhem juntas para uma interação de objetivos comuns.

Fonte: Hernani Dimantas assina, no Caderno Brasil, a coluna Sociedade em Rede.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Propostas da Economia Solidária no FSM 2009

Carta lida na Assembléia Final do FSM 2009*

Frente à crise econômica internacional afirmamos que a economia social e solidária é uma das estrátegias que vem permitindo o crescimento econômico sustentável, parte da construção de um novo modelo de desenvolvimento que é centrado no bem estar das pessoas nos 5 continentes.

Nós, trabalhadoras, trabalhadores e militantes do movimento de Economia Solidária, fazemos as seguintes propostas:

1 - No contexto de crise mundial, mais que nunca as práticas econômicas alternativas respondem através de suas experiências com novos instrumentos de finanças sociais e solidárias. É portanto fundamental reconhecer e apoiar a criação de laços cada vez mais fortes entre a economia, sustentabilidade e as finanças solidárias.

2 - É necessário resgatar o papel da FAO dentro do sistema ONU de garantir o direito a alimentação através de recomendação de incremento da produção de alimentos oriundos da agricultura familiar e da economia solidária também como forma de promoção de outro modelo de desenvolvimento, com trabalho e justiça frente ao aumento do desemprego no mundo.

3 - Temos que dar maior importância política e coerência prática na construção material do Fórum Social Mundial, garantindo cada vez maior participação de empreendimentos solidários, de agricultura familiar local, de materiais de baixo impacto ambiental, entre outros, na infra-estrutura das edições futuras do FSM.

4 - Recomendamos a criação de uma articulação de organizações que atuam com tecnologias da informação / mídias livres para elaborar uma solução tecnológica via web que permita intercâmbios econômicos solidários locais e internacionais com base em sistemas já existentes.

5 - Na construção das futuras edições do FSM, reconhecendo o aporte da Economia Social e Solidária no seio desta globalização da solidariedade, recomendamos que o território da Economia Social e Solidária fique próximo geograficamente às grandes temáticas, na construção dos territórios através das afinidades.

6 - Defendemos o apoio e mobilização pelo projeto de Lei da Merenda Escolar Brasileiro, que garante que pelo menos 30% da merenda seja comprada de empreendimentos locais da agricultura familiar e de Economia Solidária, o que implica numa ação estratégica na defesa da segurança alimentar e nutricional, e de outro modelo de desenvolvimento: local, solidário, sustentável e culturalmente diverso.

7 – Propomos o lançamento de uma campanha mundial por compras públicas e pelo consumo ético e responsável de produtos e serviços da Economia Solidária e Agricultura Familiar, além de denunciar os danos e impactos que advém do consumo de produtos das empresas capitalistas e corporações multinacionais.

8 – Nos somamos aos demais movimentos sociais de todo o mundo em suas lutas pela dignidade humana, o bem-viver, a emancipação dos povos e a transformação do atual modelo de desenvolvimento.

* Carta lida por Jaqueline Goiano Vanzelers, representante dos empreendimentos da região norte na Coordenação Executiva do FBES, na Assembléia Final do Fórum Social Mundial 2009. Belém, Pará, Amazônia, Brasil.

Fonte: http://www.fbes.org.br/

ECOFONT

Todos os dias gastamos muitos papéis fazendo os nossos impressos. Além disso, gastamos também muita tinta e, segundo a SPRANQ agência de comunicação (Utrecht, Holanda), parcialmente sem necessidade. Por isso, foi criada uma fonte nova: a Ecofont.
Uma idéia boa é sempre fácil: olhando a forma de uma letra, em quanto podemos reduzí-la sem que fique ilegível? Uma pesquisa testou vários formatos e teve o seguinte resultado: tirar círculos pequenos. Assim foi possível criar uma fonte que economiza 20% em tinta. A Ecofont pode ser baixada e usada gratuitamente. Acesse: http://www.ecofont.eu/baixar_pt.html

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Clube de Trocas de São Paulo

Clube de Trocas de São Paulo divulga calendário de atividades do mês de fevereiro e março
Espaços de Trocas, como Clubes e Feiras de Trocas, são locais onde as pessoas se encontram para trocar produtos, serviços ou saberes sem ou com o uso de moeda. Trazem produtos que elas mesmas elaboram ou que possuem e não necessitam mais. Assim, trocam por outro produto de igual valor ou adquirem a Moeda Social para facilitar as trocas.

Os espaços de trocas, organizados pelo Clube de Trocas de São Paulo, não param de acontecer... Nos meses de fevereiro e março, cinco atividades já estão agendadas. Confira e participe!!!
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Mês de Fevereiro

Dia 08.02.2009 - Clube de Trocas do Jd. Ângela e Capão Redondo
Das 13h às 17h na Associação Sonia Ingá. Endereço: R. Felipe Manara, 13 - Jd Sonia Ingá. Haverá a comercialização de alimentos doados pelo ENEDS.
Dia 14.02.2009 - Feira de Trocas
Das 10h às 17h na Rua Dr. Lund, 361, ponto de referência de baixo do Viaduto Gricério – Centro São Paulo. Teremos nesta feira de trocas 7 Empreendimentos solidários, oferecendo valor estimado a R$ 1.000,00 em produtos a base de trocas, entre os produtos, doces, salgados, bijuterias, bolsas, cachecóis, mudas e plantas, outros participantes desta feira, também estarão oferecendo outros produtos.
Dia 28.02. 2009 – CECCO Santo Amaro, Clube de Trocas moeda social Talento
Das 11h às 14h na Rua Pe Jose Maria, 555 – Santo Amaro – São Paulo – SP. Referência: do lado do Terminal Santo Amaro.
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Mês de Março

Dia 01.03.2009 – Clube de Trocas no GOTI
Das 14h às 17h na rua Delfin do Prata, 15 A – Santa Terezinha, Pedreira, Santo Amaro - SP.
Importante: Estamos necessitando de livros infantis para a creche que funciona neste espaço, o pagamento dos livros será em moeda social, quem puder ajudar, agradecemos toda ajuda.

Dia 14.03. 2009 – Feira de Trocas Solidárias – AME JABAQUARA
Das 11h às 14h na Escola Estadual de Ensino Fundamental Professora Edméia Attab. Rua Olivério Gitondo, 127 – Vila Clara (Próximo ao Posto de Saúde da Vila Clara).

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Economia, Teorias Econômicas e Sociedade

com algumas explicações e comparações entre teorias do capitalismo, PROUT e marxismo.


Realmente devemos distinguir entre o conceito de economia e as diferentes formas que a economia pode assumir na sociedade, ou seja, variando segundo os fatores relativos de tempo, lugar e pessoas (grupos sociais, povos, nações, etc.). Podemos denominar a essas diferentes formas de “sistemas sócio-econômicos”.

Cabe considerar, a este respeito, o papel das teorias econômicas, ou melhor, sócio-econômicas. Pois o conceito de economia, por si só, não pode cumprir o papel de toda uma teoria sócio-econômica. Por exemplo, a teoria de Adam Smith, sobre o liberalismo econômico, não foi simplesmente uma teoria sócio-econômica utilizada para motivar o capitalismo. Adam Smith, ao mesmo tempo em que teorizou que os interesses individuais egoístas seriam a base apropriada para o bem-estar comum, apontou também as restrições dessa teoria no alcance desse bem-estar geral da sociedade. Em particular, ele apontou que a formação de monopólios ameaçaria o funcionamento de sua economia de livre mercado.

Entretanto, tais restrições efetivamente materializaram-se. O curioso é que não é tão difícil assim de perceber-se as limitações de tal pressuposto egoísta. Mesmo pensando em uma simples família, não é difícil de se entender que, se o pai e a mãe dessa família agirem de forma egoísta, ou seja, visando apenas seus próprios interesses, as suas crianças enfrentarão sérios problemas, para dizer o mínimo. E se aquele pressuposto não dá certo nem mesmo num pequeno grupo social, como poderia dar certo em um grande grupo social, como um povo ou uma nação?

Mas continuemos com nossas elaborações, supondo que o senso comum não sirva ou não seja suficiente para rejeitarmos uma teoria como essa.

Podemos comparar essa teoria do capitalismo com outra teoria sócio-econômica, cujo acrônimo é PROUT, apresentada pelo indiano P. R. Sarkar em torno de fins da década de 1950 e início da década de 1960. PROUT é na verdade mais do que uma teoria sócio-econômica, pois trata também de outros aspectos da vida coletiva, como as potencialidades e recursos psíquicos e espirituais dos seres humanos e do ambiente como um todo, além de incluir também em seu escopo uma teoria sobre o funcionamento ou dinâmica das sociedades ou grupos humanos, chamada “teoria dos ciclos sociais”.

De acordo com PROUT, os interesses individuais egoístas jamais poderão servir como base para alcançar-se o bem-estar geral da sociedade. (Digamos, de passagem, que para atingir-se esse objetivo, PROUT destaca que é fundamental um entendimento apropriado da natureza humana, ou seja, uma definição apropriada do que é o ser humano; também um entendimento e definição apropriada do que é a sociedade humana; e conseqüentemente, de acordo com esses entendimentos, uma noção apropriada do que constitui o verdadeiro progresso individual e coletivo. PROUT efetivamente fornece definições ou elaborações apropriadas para esses conceitos-chave.)

Isto implica, segundo PROUT, que os pressupostos da teoria do liberalismo econômico de Adam Smith não permitiriam que o bem-estar comum visado pela mesma fosse alcançado.

O que isto significa ? Será que a opção entre o capitalismo e PROUT não pode ser feita com uma fundamentação clara, racional ?

Não, não. Um ponto que podemos destacar é que a teoria do liberalismo econômico não nos fornece nenhuma explicação clara sobre a dinâmica da sociedade humana, ao contrário de PROUT. Outro ponto, é que essa teoria dos ciclos sociais de PROUT justamente coloca o capitalismo numa perspectiva mais ampla, de evolução das sociedades humanas, explicando ainda no que está fundamentado este sistema sócio-econômico capitalista e quais os seus limites.

Assim, segundo PROUT, o capitalismo é uma forma de sistema sócio-econômico cujo núcleo são pessoas altamente especializadas numa das quatro mentalidades humanas básicas -- a saber, a mentalidade aquisidora, ou vaeshya, em sânscrito. Essas pessoas, quando chegam ao ponto de dominarem a sociedade, fazem com que a psicologia coletiva ou social molde-se conforme a mentalidade dominante dessas pessoas. Não é difícil entendermos isto, porque os traços da mentalidade aquisidora permeiam a psicologia coletiva de nossa sociedade, ou seja, são notáveis por todo o lado. Por exemplo, não são notáveis o individualismo, a competição, a ênfase no sucesso individual ? O que não é tão visível ou fácil de identificar são as pessoas que exercem esse domínio sobre a sociedade - e isto é justamente uma característica decorrente do sistema sócio-econômico estabelecido pelas mesmas. Por exemplo, podemos saber quem são os líderes políticos em um país, mas entendendo que esses líderes não têm realmente controle sobre o destino desse país, quem são os líderes efetivos do mesmo? Um presidente eleito, digamos, tem de trabalhar dentro de toda uma estrutura governamental, não pode trabalhar sozinho. Então os lobbies, as compras de votos e trocas de favores são formas comuns de se influenciar as decisões políticas, pois essas decisões estão ligadas ao funcionamento da economia nacional, e portanto os interesses escusos com relação a essas decisões encontram caminhos não-oficiais para buscarem o favorecimento próprio; e quando os interesses próprios falam muito alto, é normal que haja grande corrupção dentro desses sistemas de governo. Não raro os candidatos políticos que acabam eleitos são ajudados a entrarem no governo apoiados por esses interesses escusos. Enfim, esses mecanismos não são normalmente divulgados ou claramente visíveis, mas com algum esforço de entendimento é possível ver as suas diversas partes operando e, assim, juntando as partes do quebra-cabeça, pode-se entender como funciona a máquina. E quem controla essa máquina governamental, como também de tantas outras áreas da vida social, como comunicações, educação, pesquisa, etc.? Atualmente são os chamados grandes capitalistas, que através do dinheiro ou riqueza que acumularam, conseguem manipular pessoas nos diversos campos sócio-econômicos, com o fim muito bem descrito pelo termo “lucropatia”, ou, como disse, o criador de PROUT, “a doença mental do egoísmo extremo”, voltada para o controle dos recursos materiais, com ênfase na aquisição dos mesmos.

Karl Marx com certeza olhou com atenção e entendeu o funcionamento dessa economia capitalista. E então, criou conceitos tais como a chamada “mais-valia”, adequados para descrever o funcionamento dessa máquina. Entretanto, sem levar em conta a mentalidade humana operante por trás de tal sistema, e que o faz funcionar, e apenas olhando detalhes do mecanismo, como por exemplo o controle dos meios de produção, o quadro do sistema sócio-econômico fica incompleto, e em certa medida ininteligível. É natural, então, que ele tenha sugerido que o controle dos meios de produção devesse passar dos capitalistas egoístas e exploradores para as mãos de outras pessoas, criando-se um sistema de uso coletivo daqueles meios -- ou seja, o socialismo marxista, baseado na socialização dos meios de produção. Entretanto, o controle dos meios de produção não é uma causa da exploração, mas apenas um meio para ela. A causa, neste contexto, realmente é uma mentalidade humana que utiliza-se desse controle, e também da exploração humana (e da exploração em geral), para alcançar o seu objetivo, a saber: o prazer decorrente do acúmulo de bens materiais, baseado no controle da matéria com enfoque de usar essas riquezas materiais para controlar outras pessoas, a sociedade, etc. Como esse objetivo é atingido indiretamente pelo controle da matéria e pelo acúmulo de riquezas materiais, a mente humana que persegue esse objetivo inevitavelmente cultiva um certo tipo de materialismo. Entretanto, P. R. Sarkar indicou que na verdade o capitalismo está baseado fundamentalmente no que ele chamou de “princípio do prazer egoísta”.


O controle das pessoas através dessas riquezas materiais acumuladas dá-se porque tal acúmulo cria carências materiais em outras partes, e para outras pessoas. Excesso para uns, falta para outros. Como as necessidades básicas materiais são fundamentais para a manutenção da vida humana, as pessoas que carecem delas começam a correr atrás delas. E quando não têm forças para fazer esse cabo de guerra, muitas vezes acabam sujeitando-se às pessoas que são mais fortes, habilidosas ou astutas nessa disputa pela matéria. Há então uma tendência a que os mais ricos tornem-se cada vez mais ricos, e os pobres cada vez mais pobres. Adam Smith com certeza entendeu isso, mas mesmo assim não abriu mão de seu pressuposto, de que a busca egoísta dos interesses pessoais levaria ao bem-estar comum da sociedade. Provavelmente isto se deve a que ele tenha achado que esse tipo de competição seria a melhor ou única forma de promover-se melhorias na sociedade. Entretanto, parece-nos agora evidente que esse seu entendimento tem, no melhor dos casos, uma aplicabilidade muito mais limitada do que ele inicialmente imaginou.

Realmente, em acordo com isto, PROUT prescreve que o âmbito da iniciativa privada deva ser reduzido a um setor bastante limitado da economia, que é o dos pequenos negócios operando com bens materiais definidos como “não-essenciais”. Além disso, PROUT estabelece, em um de seus princípios fundamentais, a necessidade de uma limitação à acumulação individual, ou seja, o estabelecimento de um teto máximo para a mesma. No caso em que o recebimento de salários fosse o meio para tal acumulação, isto implicaria no estabelecimento de um “salário máximo”.

Para a implementação do sistema sócio-econômico previsto por PROUT, é fundamental a atuação coletiva de pessoas determinadamente voltadas para o bem-estar comum, e não baseadas em interesses egoístas ou mesquinhos, sejam pessoais ou grupais. Pelo contrário, essas pessoas, que serão fundamentais na implementação e manutenção, ou operação, de uma sociedade humana organizada segundo os moldes gerais de PROUT, deverão desenvolver bastante bem, em si mesmas, o espírito de serviço desinteressado, ou melhor, altruísta, para outras pessoas e outros seres, e também o espírito de sacrifício, ou seja, a capacidade de abrir mãos dos próprios confortos e comodidades, em prol de pessoas menos favorecidas.

Mahesh
Florianópolis